Internet com educação – Riscos jurídicos
- Cenário Atual:
A internet não é mais novidade, presenciamos um momento de transição,
cuja sociedade se torna cada vez mais conectada e as crianças e adolescentes
integram uma geração digital, onde o conhecimento tem valor significativo. Com
o progresso é normal que pais e educadores busquem novas formas de integração.
O fato é que a tecnologia mudou muita coisa em nossas vidas, mas será que
estávamos preparados para isso?
Escutamos por diversas vezes chamadinha de nossos pais como: “não fale
com estranhos”, “não pegue carona com estranhos” “não aceite bala de
estranhos”, mas não escutamos que não devemos pegar carona em comunidades de
estranhos” ou não abrir email de estranhos… a verdade é que nossos exemplos
devem ser atualizados de acordo com o cenário atual, caso contrário, corremos o
risco de não sermos ouvidos.
Falo como advogada, mas acima de tudo como pedagoga, que a situação é
preocupante quando o assunto é criança e internet ou mesmo adolescente e
internet pois se nem mesmo os adultos estão preparados? Vejo isso acontecer com
freqüência, a falta de preparo pelos pais e por educadores para lidar com as
questões que envolvem a internet, pois infelizmente, muitos ainda passam a
impressão de que se trata de um espaço além da vida, sem limites, sem regras e
sem legislação. Mas afirmo com veemência “Ledo engano” somos responsáveis por
todos e qualquer ato seja culposo ou doloso, ou melhor, tenha sido com intenção
ou não.
Tem sido cada vez mais freqüente incidentes envolvendo crianças e
adolescentes e por conseqüente a responsabilização dos pais ou responsável na
esfera civil chegando a ter que indenizar a outra parte e também a própria
responsabilização do adolescente pela Vara da Infância e da Juventude. Mas
falaremos em tópico específico sobre este assunto.
O fato é que se as escolas, educadores e pais dessa garotada, não
assumirem um papel de orientar, mas de forma continuada, afinal educação
acontece durante toda a vida, acreditem, teremos no futuro sérios problemas.
Portanto, as vezes me pergunto, onde está a ética das pessoas? Temos sim que
ser exemplos, não me refiro aos educadores, neste sentido, mas a todas as
pessoas, sejam de que profissão for. O pai deve dar um bom exemplo para o filho
e não achar bonito o filho publicar fotos na internet, de coleguinhas da
escola.
Até onde me lembro a ética traz em sua essência valores da sociedade
inerentes a determinada época. Assim, ocorre com várias situações, pois a
privacidade, por exemplo, as pessoas da idade média, tinham outro conceito e
dimensão de privacidade, aliás hoje temos muito mais privacidade do que naquela
época.
Portanto a seguir, falaremos um pouco sobre responsabilidade legal, na
seqüência sobre os riscos mais comuns e prevenção.
- Responsabilidade
Legal
Em meu trabalho com alunos do ensino fundamental e médio, pude perceber
que a maioria, se não todos acreditavam que não são responsabilizados por seus
atos e muito menos seus pais, quando o assunto é internet.
Mas não é bem assim, veja o exemplo abaixo:
O professor foi vítima dos próprios alunos numa comunidade do site de
relacionamento Orkut onde sua imagem é satirizada. Os alunos também chegam a
ameaçar furar os pneus do carro de J. e jogar açúcar no tanque de gasolina do
veículo.
Sentindo-se ofendido, o professor ingressou em juízo com ação de
indenização de danos morais contra os responsáveis pelos adolescentes
participantes da comunidade. Na ação, J. sustenta que os filhos dos réus
criaram uma comunidade no “site” de relacionamentos “Orkut”, satirizando sua
imagem. Aduz que a iniciativa dos menores via “Internet” afronta sua imagem
como professor perante os demais alunos e colegas de trabalho, bem como perante
a sociedade, causando-lhe constrangimentos de ordem moral. Salienta que todos
os filhos dos réus, com exceção de dois, responderam medida sócio-educativa que
reconheceu a conduta dos menores como análoga aos crimes de difamação e
injúria.
Entre as mensagens trocadas pelos alunos constam ameaças e zombarias ao
professor, além de ofensas por meio de palavrões.
….
“Os danos morais causados por divulgação, em comunidade virtual (Orkut)
de mensagens depreciativas, denegrindo a imagem de professor (identificado por
nome), mediante linguagem chula e de baixo calão, e com ameaças de depredação a
seu patrimônio, devem ser ressarcidos. Incumbe aos pais, por dever legal de
vigilância, a responsabilidade pelos ilícitos cometidos por filhos incapazes
sob sua guarda”, diz a ementa do julgado.
A notícia acima mostra que os pais foram condenados a indenizar, vez que
entende-se que houve culpa em vigilando, ou seja, negligencia no dever de
vigilância. A legislação é clara, tanto o Código Civil como o Estatuto da
Criança e do Adolescente são claros na questão de responsabilidade, portanto, os
pais tem sim o dever de “vigiar” , monitorar o que seus filhos fazem na
internet, primeiro por zelar pela segurança de seus filhos e segundo para poder
orientá-los para que não cometam infrações.
2.1 Como funciona com a criança e com o adolescente?
O ECA considera como criança a pessoa que tenha até 12 anos incompletos
e adolescente de 12 a 18 anos. Em princípio, todas as condutas tipificadas no
Código Penal como crime para os adultos, é considerado como Ato Infracional
para menores de 18 anos. Assim, a criança ao cometer um ato infracional será
encaminhada para o Conselho Tutelar que deverá determinar uma das medidas de
proteção previstas no art. 101 do ECA que pode ser advertência, encaminhamento
para tratamento psiquiátrico, psicológico, programas educacionais, entre
outros.
No caso do adolescente, este será encaminhado para a Vara da Infância e
da juventude, onde alem da aplicação de medidas de proteção poderá ser aplicado
também medidas sócio-educativas, que pode ser prestação de serviços a
comunidades, como auxílio em hospitais, palestra em escolas, etc.
Por aqui já foi possível entender que há responsabilidade. Já na esfera
civil, os julgados tem decidido como vimos acima, pela responsabilização dos
pais, ou responsável.
Esta questão é muito importante que seja levada ao conhecimento dos
jovens, pelos professores em sala de aula. Temos que trabalhar a prevenção !
Além da ética, saber o que pode lhe acontecer (responsabilidades) sempre
traz bons resultados.
2.2 E a responsabilidade dos pais como fica?
Pelo art. 22 do ECA, que complementa as obrigações elencadas no Código
Civil, aos pais, incumbe o dever não apenas de sustento, mas também de
guarda e educação de seus filhos. Portanto, não apenas moralmente, mas
também juridicamente, os pais tem o dever de zelar pela segurança do filho e
muitas vezes isso envolve disciplina e monitoramento. Não há invasão de
privacidade entre pai/mãe e filho, mas sim um cuidado necessário. Isto não quer
dizer que os pais tenham que ler linha por linha do que seu filho escreve em
uma mensagem, mas deve sim, procurar saber com quem ele está conversando, ou
que tipos de fotos ele está passando para seus amigos. Além disso, os pais têm
também o dever de orientar e cuidar da educação dos filhos e prepará-los para a
vida.
Nas palestras que faço para os pais, costumo perguntar 2 coisas:
- Você
sabe o que é o Orkut e o YouTube?
- Você
sabe me dizer neste momento se o seu filho está no Youtube? ( ou seja se
tem filme dele no youtube)
Menciono o YouTube porque tem sido comum a garotada de 10, 12 anos ( não
apenas os adolescentes), filmarem seus colegas e publicar no YouTube, ou ainda,
meninas deixar se filmar sem roupa ou ficar na frente da webcam e depois
encontrar suas fotos na internet.
2.3 Quanto a responsabilidade dos professores
A responsabilidade do professor vai além da sala de aula, deixando de
lado a questão do compromisso com seus alunos, que espero ser inerente a cada
um no momento de sua escolha profissional, temos a questão de responsabilidade
por nossos atos, seja por ação ou omissão. Portanto, saber que alguma coisa
está acontecendo e não tomar providência nenhuma, pode ser perigoso.
Imagine um professor que sabe que um de seus alunos está sendo vítima de
boolying, e permanece omissa. Se você enquanto professor não sabe o que é o
boolying, aconselho a mudar de profissão. Corra, pois está muito atrasado! Em
linhas muito gerai o boolying se caracteriza pela prática de atos de repressão,
ameaça, humilhação entre colegas. Não é uma atitude nova, mas a internet sim, é
um meio novo pelo qual potencializou os efeitos do boolying, pois seu alcance é
muito maior, pessoas pensam se esconder e o que foi publicado, dificilmente
sumirá totalmente.
Outro cenário interessante, cuidado com o que escreve para seus alunos
em comunidades, blogs, emails etc. Pois presenciei casos de escolas em que o
professor ao deixar recado para seu aluno no Orkut, acabou expressando certo
carisma e particularmente eu não vi nada de mais, mas os pais do garoto acharam
que a professora estava assediando o menino. Não é preciso nem entrar em
detalhes não é mesmo? Ele e outros alunos saíram da escola.
Os casos acontecem de monte, mas a maioria dos problemas são resolvidos
internamente, é lógico que o poder da mídia pode ser benéfico, mas também
destrói um império em algumas horas, bem como os pais nunca tem interesse em
expor seus filhos.
Fique atento, pequenos detalhes podem fazer diferença, para o bem e para
o mal!
- Riscos
mais comuns
Com base na prática do dia a dia de meu trabalho com crianças e jovens,
posso dizer que os perigos mais comuns são:
- uso irrestrito e ilimitado (não tem hora, nem limite) da internet sem
orientação e monitoramento dos pais;
- Emprestar a senha para amiguinho (a) por prova de amizade;
- Tirar fotos e mandar para o namoradinho, que por sua vez espalha para
os colegas, ou publica na internet;
- Contar sua vida em comunidades como o Orkut, divulgando onde mora, com
quem, o que seus pais fazem, etc
Cito ainda a o desconhecimento do que é certo e errado e de que os pais
podem ser responsabilizados por seus atos e que o menor também reponde passando
por medidas sócio-educativas, digo isto porque temos dois cenários, um em que a
criança ou adolescente é vítima e outra em que por descuido, desconhecimento ou
ate mesmo por brincadeira acaba por cometer um ato infracional. Estes são os
casos de comunidades criadas para ameaçar, humilhar alguém, por exemplo.
- Como outros países estão tratando o problema?
Outros países estão tomando providências, veja neste link matéria
publicada ontem, que menciona uma lei em país estrangeiro, que obriga as
escolas que recebem desconto nos serviços de telecomunicações e acesso à
internet a ensinar seus alunos sobre segurança online.
O Brasil já está atrasado, e poucas escolas tomaram a iniciativa de
incluir em seu currículo o ensino de “Ética e Cidadania Digital”.
3.1 Sobre Segurança na Internet
A segurança depende de um conjunto que abrange a tecnologia e também
nossa conduta, mesmo assim, não existe segurança 100% pois a cada dia temos
situações novas. Uma das grandes preocupações da internet é a engenharia
social, neste entende-se que a pessoa tenta conquistar o outro usuário se
passando por alguém que na verdade não é, ou mesmo se passando por uma marca,
assim o usuário confia e passa seus dados. No caso de pedofilia é comum adultos
se passarem por crianças para conquistar e se aproximar de suas vítimas.
Portanto, não podemos depositar nossa confiança apenas em sistemas de
segurança, exemplo software de monitoramento, a segurança está na atenção dos
pais, dos educadores e de todas as pessoas, junto com as ferramentas de
monitoramento, mas principalmente na orientação passada tanto para a criança
quanto para o adolescente.
3.2. O que a escola pode fazer ?
A escola tem um compromisso com a educação do país e a educação nunca
será completa se não abordar questões reais e atuais. Se o computador faz, cada
vez mais, parte do cotidiano das pessoas, seja na vida pessoal como
profissional, a escola não pode ser omissa. Deve não apenas ensinar a utilizar
os recursos disponíveis, mas utilizar de forma ética, segura e legal.
Portanto, a escola deve elaborar um código de conduta e uma cartilha de
conscientização, assim poderá obter um resultado a curto prazo, mas é preciso
ações contínuas para que não caia no esquecimento, pois trabalhar cultura leva
tempo, neste caso, para um resultado efetivo é preciso trabalhar disciplina
específica, ou seja, dentro de ética e cidadania, deve-se acrescentar a questão
digital, com conteúdo específico e atividades online.
Além do mais, a escola deve pensar na prevenção de responsabilidade
legal, pois muitas vezes as fotos indevidas, por exemplo, são tiradas dentro do
estabelecimento de ensino, ou mesmo, alunos que filma professores para publicar
no YouTube.
- 4.
Ética e Cidadania Digital um dever de todos
Sim, digo de “boca cheia” que o ensino de ética e cidadania digital é um
dever de todos, a começar em casa e complementado na escola, mas cabe também
aos tios, tias, primos, irmãos, cabe também ao governo, criando programas de
Cidadania Digital, capacitando os educadores, que são a semente para disseminar
este conhecimento para os alunos. Não podemos exigir o que não foi ensinado,
mas se deixarmos como está, sem orientação, a tendência é o aumento de
incidentes que podem prejudicar os usuários a qualquer época de sua vida, pois
um conteúdo publicado na internet, você nunca saberá onde ele foi parar.
- Mensagem
da Autora:
O art. 17 do ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente garante à
criança e ao adolescente o direito ao respeito e a inviolabilidade da integridade
física, psíquica e moral, bem como a preservação da imagem e valores.
O art. 18 do mesmo dispositivo traz que é dever de todos zelar pela
dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer
tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório e constrangedor.
Todos nós cidadãos temos o dever de orientar e zelar pela segurança
desses jovens e temos também um compromisso com a educação, seja formal ou
informal. Educar para o uso ético e legal, não é um luxo, mas uma obrigação
para aqueles que querem viver em harmonia e segurança. Os meios tecnológicos
estão diante de nós e com eles seus benefícios e riscos. Não podemos evitar que
eles existam, mas podemos evitar que eles se concretizem
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